Numa das aulas de Literatura Infantil e Juvenil, nossa professora sugeriu-nos que assistíssemos a um curta e, com base nele, tecêssemos alguns comentários. Passei horas analisando a essência de vários deles e um, em especial, chamou-me a atenção: Ler é o melhor remédio, de Luiz Fernando Veríssimo. Ler não deveria ser imposição, mas hábito. A leitura nos transporta para fora de nós e nos leva para o infinito e, ao retornarmos, já não somos mais os mesmos. Através das palavras, somos conduzidos levemente para a esfera do pensamento e lá as ideias se encontram e, por afinidade, se unem e formam conceitos variados. Todos têm acesso à leitura. Como diz Luiz Fernando Veríssimo, devemos ler jornal, pois nos mantém informados desse mundo crasso e cruel que nos cerca e de que, inevitavelmente, fazemos parte. Devemos ler outdoor que está estampado a nossa frente durante a passagem pelas ruas da cidade e que funcionam como verdadeiras artérias a nos levarem a um ponto indeterminado. Podemos ler letreiros da estação de trem, aquele mesmo trem que vai e volta todos os dias pelo mesmo trilho, sem reclamar, mas que nos leva pacientemente para o nosso destino assim como um livro através de suas páginas. Se quisermos, podemos ler os preços dos supermercados em cujas prateleiras encontram-se os mantimentos que sustentarão nosso corpo de pé para que possamos viver mais e podermos comparar produtos, encontrar amigos, perdoar inimigos, passar uma receita ou folhear um livro. Se nada disso adiantar, leiamos alguém. O ser humano é um livro personificado. Podemos ler o andar, o olhar, o falar, o gesticular, o vestir, o escrever, enfim, leiamos alguém nas entrelinhas e descobriremos um mundo incomensurável, um mundo de sonhos, de desejos e de ambições, de dor, de alegria, de inquietação e de paz. Ler é a maior comédia. Nem tudo o que lemos tem cunho de seriedade, de ponderações, de tristeza. Podemos dar muitas gargalhadas num ato de leitura. Uma gargalhada para chacoalhar nossas emoções e fazer dos nossos dias um verdadeiro momento de descontração. Se quisermos, por falta de opção, leiamos etiqueta jeans. Decifrar o que traz imbricado aquele nome tão importante para um mercado antropofágico que dia a dia nos devora porque somos seres passíveis, acomodados, ou porque somos verdadeiramente um eu-etiqueta que caminha pela vida carregando a força de uma marca. Como diz Carlos Drummond de Andrade em seu poema Eu Etiqueta : (...)Agora sou anúncio Ora vulgar ora bizarro. Em língua nacional ou em qualquer língua (Qualquer, principalmente.) E nisto me comprazo, tiro glória De minha anulação. Não sou - vê lá - anúncio contratado. Eu é que mimosamente pago Para anunciar, para vender(...) Se desejarmos despertar a criança que existe em nós, leiamos histórias em quadrinho. De maneira colorida e descontraída, vamos deixando de ser essa casca ponderada, metódica e regrada do dia a dia e entrando num mundo de alegria, de desapego, de faz de conta, mas também aprendendo com certas personagens com as quais nos identificamos e, nesse processo, nos transformarmos, crescermos e nos tornarmos ainda melhores. Leiamos também a continha do bar, aquela que nos faz perder noites de sono por parecer não ter mais fim, mas que ao analisarmos, um misto de ideias passa por nossa cabeça fazendo-nos refletir sobre as possibilidades de um dia chegarmos à estabilidade financeira. Podemos ler, ainda, a bula de remédio que é, muitas vezes, desprezada por falta de vontade de ler ou porque não conseguimos visualizar as palavras ou ainda por não entendermos o significado de alguns termos, mas que estão ali, prontas para receberem olhos à procura da melhor explicação. Leiamos a página do ano passado perdida no canto da pia enrolando chuchus, mas que bem temperados dão uma bela salada. Temperemos a página esquecida com a vontade e a determinação de uma leitura curiosa para descobrirmos que algo que parece ser tão insípido pode ter o sabor que desejarmos. Por fim, leiamos a vida; leiamos as possibilidades, as impossibilidades, as dificuldades, as alegrias, as tristezas, as noites, os dias; leiamos tudo o que nos rodeia; leiamos a natureza, a chuva, o sol, os animais, as pessoas que passam, as flores, o barulho da água que cai, o vento que sopra, a cultura de um povo, a literatura, mas leiamos. Só assim, a transformação surgirá, o crescimento como sujeitos ficará evidente e a sociedade se nos apresentará não mais como uma névoa que esconde um mundo, aparentemente, indecifrável, mas como um livro aberto a contar a história da humanidade.
Profª de Língua Portuguesa: Márcia C. C. de Carvalho
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