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sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Será o fim do nosso complexo de vira-latas?

Com o Brasil se tornando potência, empresas do país já não deixam a dever a companhias dos países desenvolvidos


A seleção estava formada e pronta para o jogo! Quatorze dos mais seletos protagonistas mineiros escalados entre vários que buscavam a chance de representar, não só o rico estado das Minas Gerais, mas principalmente esta nova potência tupiniquim que todos (bem informados) lá fora idolatram.

Fora de um contexto temporal e literário, o título deste artigo, somado à passagem inicial, poderia até ser confundido com palavras de nosso ilustre Nelson Rodrigues, que na década de 50 usou o termo "Complexo de vira-latas" para definir a postura de inferioridade assumida pelos brasileiros após o trauma sofrido pela derrota na final da Copa de 50 para os uruguaios, em pleno Maracanã.
Mas não, senhores. Estamos em 2012, agosto, e em plena Frankfurt, Alemanha. E nossos craques aqui em destaque não são os da arte dos gramados, que por anos a fio foi sem dúvidas a maior, para não dizer a única, representação brasileira no exterior.

Perdendo o complexo de vira-latas

"Nosso grupo é um dos maiores da Alemanha e somente esta loja que os senhores estão visitando, das mais de 200 somente na Alemanha, possui nada menos que 16.000 m² e 105 funcionários", disse orgulhoso o altivo Dobermann ariano, encarregado de apresentar sua empresa em nossa visita, iniciando um curto diálogo:
- E o senhor, por exemplo, quantos funcionários tem na sua maior loja? – e perguntou o alemão, visivelmente orgulhoso, a um dos "pequenos vira-latas" da nossa querida República das Bananas.
- 650, responde "humildemente" o representante verde-amarelo.
- Quantos? 150? – indaga de volta, agora com um ar mais surpreso que superior, o alemão.
- Não. O senhor não me entendeu bem. São 650 funcionários em nosso "modesto estabelecimento"de 25.000 m², o mais expressivo dos oito que possuímos, todos especializados somente no segmento elétrico – respondeu o brasileiro.
Este diálogo ilustra um pouco o que foi nossa última experiência com um grupo de empreendedores do setor de revenda de material de construção de Belo Horizonte e região metropolitana, organizados em uma missão empresarial idealizada pela sua associação empresarial local, ACOMAC, com o suporte técnico do Sebrae/MG. O grupo, que tivemos a oportunidade de ciceronear pessoalmente, fez uma incursão de 10 dias na Europa, nomeadamente Alemanha e Itália, para conhecer melhor os antecedentes do setor e tentar entender a realidade atual do seu mercado, matcon, na Europa.
A riqueza e abrangência da agenda técnica por si só já teria sido suficiente para justificar a iniciativa. Na Alemanha, a análise do mercado local que hoje está muito orientado às grandes lojas de cadeias locais, que tem na esmagadora maioria de seu mix produtos fabricados pela indústria nacional, serviu de exemplo para entender que um planejamento setorial, apoio do governo e uma valorização junto aos consumidores foram os alicerces básicos para a sustentabilidade e fortalecimento deste setor do varejo, que notoriamente em todo mundo já está bastante globalizado.
Já os workshops na Itália com duas associações nacionais de revenda de material de construção e ferramentas, somados às visitas a pequenos varejistas e redes locais, deixaram bem claro que somente uma real integração da cadeia de distribuição, onde a indústria soma esforços com o varejo em ações de mercado conjuntas, que contam também com a participação do governo, estão sendo fundamentais para as pequenas empresas do setor sobreviverem à crise atual em que se encontra o país.
O difícil de mensurar na verdade são os ganhos intangíveis de iniciativas como estas. Este momento quase mágico em que vira-latas do antigo "terceiro mundo" se dão conta de seu real pedigree e se transformam em "neo-nobres"; objetos de admiração e até inveja dos seus pares "ex-primeiro mundo". Um verdadeiro orgulho de ser (empresário) brasileiro. Promover este entendimento ao empresário brasileiro, seja ele micro ou grande, do atual cenário econômico brasileiro, contextualizado na nova dinâmica e oportunidades globais, através de experiências sensoriais in loco não tem preço.
Diversas agências de promoção empresarial – públicas, mistas ou privadas – em conjunto com as associações empresariais estão intensificando esta atividade de missões empresariais ao exterior. As missões são quase sempre organizadas em base a uma ampla agenda técnica de visitas a empresas locais, workshops com as associações empresariais locais e visitas a feiras setoriais. Estas experiências internacionais não somente incentivam a discussão de novas práticas de gestão, mas também, e principalmente, proporcionam ao empresário brasileiro a oportunidade de se avaliar e fazer uma releitura da posição de seu negocio em uma perspectiva muita mais ampla que a do seu mercado local. Seja uma viagem de oportunidades de negócios (importação ou exportação) aos tigres asiáticos ou uma imersão para benchmarking no velho mundo, experiências empresariais em grupo acabam trazendo um beneficio intangível a sociedade que vão além, muito além, das próprias oportunidades de novos negócios que inevitavelmente acabam por gerar.
O Brasil esta sendo descoberto e muito cobiçado pelo mundo e chegou a hora também de nos redescobrimos em todos os âmbitos e principalmente de nos auto-avaliarmos. É fato que a nossa tradicional República das Bananas esta se transformando aos olhos do mundo neste agora "real" e reconhecido oásis das oportunidades, então é fundamental que nós brasileiros – governantes, estudantes, empresários, cidadãos – nos despeçamos o mais breve possível deste nosso antigo companheiro imaginário, vira-lata, que ainda insiste em se esconder no fundo do nosso inconsciente popular.

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